Em meio à ebulição global, a utilização de tecnologias ancestrais e contemporâneas pode impulsionar uma transição sistêmica que garanta justiça socioeconômica para as pessoas mais afetadas por essa crise.
Desde a Revolução Industrial, o modo como organizamos nossa sociedade e nossa economia tem imposto um alto custo ao clima e a diversas comunidades ao redor do planeta, resultando no atual estado de emergência climática.
O desenvolvimento do modelo econômico capitalista atual – que nasceu praticamente de modo simultâneo ao sistema industrial – tem impulsionado a perpetuação de desigualdades, intensificado deslocamentos forçados, gerado catástrofes humanitárias e provocado a perda de biodiversidade, ameaçando o equilíbrio da vida na Terra e gerando o contexto dessa crise. Embora a descarbonização da economia seja vista como uma das principais saídas para essa emergência, é preciso reconhecer que isso apenas não é suficiente.
Isso porque a crise climática transcende sua dimensão puramente ambiental: ela é uma sistêmica; por isso, engloba questões interseccionais relacionadas a problemas socioambientais, raciais e de gênero. Nesse cenário complexo, a “Transição Justa” surge como uma alternativa imprescindível para se preservar a vida na Terra e se alcançar um sistema que assegure a justiça para a natureza e sociedade.
O conceito de “Transição Justa” teve origem na década de 1970 nos Estados Unidos, quando sindicatos trabalhistas, movimentos ambientais e povos indígenas se uniram para lutar contra a poluição industrial, em um momento em que as denúncias contra crimes ambientais estavam cada vez mais frequentes.
Desde então, o termo evoluiu globalmente, sendo incorporado em movimentos internacionais e acordos importantes, como o próprio Acordo de Paris assinado em 2015, o principal compromisso mundial de combate à crise climática atual, que estabelece a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) a fim de mitigar os riscos e impactos dessa emergência.
Porém, o entendimento de ‘transição justa’ não deve ser limitado à redução das emissões de GEE. Ela busca uma mudança sistêmica em nossa forma de produzir, consumir e viver em sociedade, transitando de uma economia extrativista para uma economia regenerativa, como proposto pelo Climate Justice Alliance. Assim, ela abrange não apenas o setor energético, mas todos os outros, como o de transporte, o do agronegócio e o da moda. Dessa forma, ela se torna a estratégia ideal de combate à crise climática – também sistêmica.
Um exemplo prático dessa abordagem seria a transição de um sistema industrial de alimentos para um modelo de soberania alimentar, com ênfase na valorização da produção e do mercado locais, promovendo a autossuficiência, a sustentabilidade e a autonomia das comunidades, estabelecendo um sistema mais equitativo e com participação ativa das pessoas mais afetadas.
É importante destacar que a “Transição Justa” busca criar soluções a partir da perspectiva das pessoas mais impactadas pelo atual sistema de produção e pela crise climática, como as comunidades indígenas. Por isso, centraliza-se e valoriza-se estratégias e tecnologias ancestrais, ricas em conhecimentos frequentemente desconsiderados pela ciência ocidental. Um exemplo é o princípio do “bem-viver“, que prevê a utilização de técnicas agroecológicas na produção de alimentos.
Ao mesmo tempo, ela não descarta a utilidade de tecnologias contemporâneas, como a Inteligência Artificial (IA), desde que utilizadas com segurança e sejam produzidas, cada vez mais, por meio de processos éticos e responsáveis. Isso implica, portanto, considerar todos os possíveis impactos negativos das tecnologias desenvolvidas no âmbito do atual sistema exploratório.
Nesse sentido, a IA também pode ser uma ferramenta para regenerar esse sistema, colaborando na redução de emissões de carbono nas indústrias, gerenciando sistemas de energias renováveis para diminuir a dependência de combustíveis fósseis e promovendo o bem-estar de comunidades locais.
O objetivo da transição justa é preciso: transitar para um sistema global que garanta a justiça climática, socioeconômica, racial e de gênero. As ferramentas, como a IA, são meios que devemos cocriar e aprender a utilizar, especialmente com aqueles que mais necessitam dessa transição, para garantir plenamente os direitos humanos e da natureza.
Claudia Castanheira é comunicadora socioambiental, professora e pesquisadora com foco em sustentabilidade e justiça socioambiental. É mestra em Discurso e Sustentabilidade (USP), fundadora do Brechós pelo Mundo e colaboradora do Fashion Revolution da Bélgica. @euclaudiacastanheira
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