Você sabia que no Brasil tem uma das maiores populações cristãs do mundo? De acordo com uma pesquisa DataFolha de 2019, 50% declaram católicos e 31% evangélicos. Uma minoria, 0,3%, declara-se seguidora de religiões de matrizes africanas. E as estatísticas mostram que pessoas e terreiros são os principais alvos de crimes de ódio e intolerância religiosa no país. (Politize)
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No ano passado, das 571 denúncias de violação à liberdade de crença registradas no Brasil, mais da metade estavam relacionadas a religiões afro, segundo dados do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH).
Fica mais claro a intolerância ligada ao racismo contra pessoas vinculadas ao candomblé e à umbanda quando olhamos o recorte racial do grupo: dentre os que se dizem vinculados a estas crenças, há uma concentração de mais de 20% de pessoas que se declaram pretas, de acordo com o IBGE.
- Estudo mostra que religiões de matrizes africanas foram alvo de 91% dos ataques no RJ em 2021 (G1)
- Como a intolerância religiosa afeta os direitos das crianças? (Lunetas)
Limites entre religião e política
Brasil tem raízes no Estado religioso
Apesar de o Brasil ser um Estado laico, muitas vezes uma linha tênue mantém separada a política da religião. Em momentos decisivos como o de eleições, isso se torna ainda mais claro.
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Mas a mistura de assuntos públicos com crenças individuais não é nova por aqui, segundo José Antonio Miranda Sepulveda, coordenador do Observatório da Laicidade na Educação da Universidade Federal Fluminese (OLÉ/UFF).
“A gente tem uma história carregada de uma relação imbricada entre Estado e religião. A gente herda, enquanto país independente em 1822, um Estado religioso ou o que os historiadores chamam de padroado, uma fusão entre Estado e religião.”
Sepulveda, que também é doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), elenca outros fatos que mostram como o Estado brasileiro se “organiza de forma umbilical com a religião”:
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- A Constituição brasileira de 1924 colocou como chefe de Estado o Imperador.
- Durante todo o século XIX o Brasil teve intensas tensões com o Vaticano porque a Igreja brasileira se reportava ao Imperador. “Inclusive, era ele quem nomeava Bispo”, coloca o professor José.
- Funcionalismo público x Igreja: “boa parte dos serviços públicos que foram criados no Brasil, foram delegados à Igreja. Como o serviço funerário: se você não fosse católico, você não poderia enterrar o seu parente, né? De maneira geral, boa parte do que era oferecido para o público no Brasil era oferecido por uma entidade privada, a Igreja Católica, que tem seus interesses próprios, que não são os interesses do Estado. Só que aqui no Brasil se confundiu”, diz.
O professor refere-se da confusão entre Estado e Igreja. “Essas confusões são enraizadas de tão forma que não é fácil eliminá-las. Até que você naturaliza que a religião faz parte desse universo, do Estado”. É por isso que, segundo o professor, é comum vermos nas paredes em ambientes como escolas públicas e Assembleias Legislativas o crucifixo, símbolo católico. “Se fossem retirar um símbolo desse e colocar um de uma religião de matriz africana, as pessoas iam naturalizar da mesma forma? É claro que não.”
Estado laico e liberdade religiosa
Mas as tensões “democráticas” entre religiões são naturais, segundo o professor. Ele explica como a laicidade é o princípio que garante que os cidadãos possam escolher, disputar, debater e expressar diferentes crenças e manifestações religiosas.
Ouça um trecho da entrevista do Curto News com o professor José Sepulveda:
Eleição e debate religioso
Segundo o professor da Faculdade de Economia da USP Raphael Corbi, “a religião está mais à frente da discussão pública e os valores religiosos estão determinando mais, dando mais forma a como a sociedade se comporta”.
Para observar esta relação próxima durante o período eleitoral deste ano, o Centro de Estudos de Religião e Políticas Públicas (CERP) da USP, encabeçado pelo professor Raphael, criou o “Monitor Liderança”. O projeto coleta e analisa tweets de figuras religiosas influentes no Brasil, e as movimentações políticas da religião que estão afetando a sociedade. Acompanhe aqui as edições semanais dos boletins do projeto.
Curto Curadoria
- Religiões de matriz africana são maiores alvos de ataques na internet (Alma Preta)
- Deus virou um detalhe na campanha eleitoral (Opinião/O Globo)🚥