Escândalo de corrupção abala universo das criptomoedas na Venezuela

O mundo das criptomoedas na Venezuela, muito ativo pela busca de um refúgio frente à inflação e pelo baixo custo da eletricidade necessária para operar com estes ativos, foi abalado por um escândalo de corrupção que tem origem na empresa estatal do petróleo PDVSA.

O governo de Nicolás Maduro apostou forte nos criptoativos como forma de fugir das sanções financeiras impostas pelos Estados Unidos contra a Venezuela, e chegou a lançar uma criptomoeda local, o petro, em 2018.

PUBLICIDADE

As coisas, no entanto, sofreram uma reviravolta: a Superintendência Nacional de Criptomoedas (SUNACRIP, estatal) viu-se envolvida em um escândalo de corrupção na PDVSA e em outras empresas e instituições estatais. Dezenas de funcionários foram detidos na trama, que levou também à renúncia do outrora poderoso ministro do Petróleo, Tareck El Aissami.

O caso

Após denúncias da Justiça sobre irregularidades na gestão de fundos de operações petroleiras realizadas com criptoativos, o presidente da superintendência, Joselit Ramírez, foi detido em março, assim como o chefe de operações de mineração digital da instituição, Rajiv Mosqueda.

Investidores em criptomoedas asseguram que, em meio às investigações, múltiplas ordens para apagar fazendas de mineração digital (onde estes ativos são produzidos) e exchanges (plataformas de intercâmbio de criptos) paralisaram o ecossistema local.

PUBLICIDADE

A AFP consultou fontes judiciais a respeito do número de fazendas e exchanges afetados, mas até o momento não obteve resposta.

“Estão torpedeando a mineração (de criptomoedas). Investiguem o que tiverem que investigar, mas por que têm que apagar tudo?”, perguntou, em conversa com a AFP, Humberto Quevedo, diretor da Associação Nacional de Criptomoedas (ASONACRIP, privada) e da plataforma especializada CryptoLand Venezuela, que pede mais “transparência” das autoridades.

“Você tem um problema e a solução é pegar uma metralhadora e matar todo mundo?”, perguntou Quevedo.

PUBLICIDADE

A Superintendência de Criptoativos está agora sob controle de uma junta interventora, mas sua sede permanece fechada desde a prisão de Ramírez. Até mesmo as letras metálicas ‘SUNACRIP’ na porta do prédio no centro de Caracas foram retiradas, constatou a AFP.

O uso de criptomoedas era intenso na Venezuela muito antes da aposta de Maduro no petro. Estes criptoativos foram vistos como um refúgio frente a uma inflação crônica e à constante depreciação da moeda local, o bolívar.

Segundo uma pesquisa apresentada no ano passado na Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento, 10,3% da população venezuelana possuem ‘criptos’, frente a 8,3% nos Estados Unidos e 5% no Reino Unido.

PUBLICIDADE

Mineração digital no “limbo”

A mineração de criptomoedas como o bitcoin proliferou na última década na Venezuela, impulsionada pelo baixo custo da energia necessária para a sua produção ou ‘mineração’, apesar dos severos problemas de abastecimento elétrico. Perseguida a princípio, foi autorizada pelo governo quando este se voltou para os criptoativos e a fomentou com fazendas de mineração estatais.

A SUNACRIP, criada em 2018 pelo governo Maduro, concedia licenças de operação.

“Todas as pessoas que tentaram legalizar seu estado (frente a SUNACRIP) ficaram expostas”, diz à AFP Luis – nome fictício para proteger sua identidade -, que apagou duas fazendas de mineração de bitcoins nas quais tinha cerca de 500 máquinas. “Estão melhor os que o faziam de forma anônima”, queixa-se.

PUBLICIDADE

“Eu eliminei as fazendas. É um absurdo que venham e te obriguem a apagar tudo até novo aviso. Tudo isto nos coloca de novo em um limbo legal”, acrescenta.

Falhas com o petro

Ao mesmo tempo, o clima esfriou ainda mais nos últimos dias pela paralisação das transações com petros, sem explicações das autoridades. O uso desta criptomoeda sempre esteve praticamente restrito a operações com o Estado.

“Repentinamente e sem aviso”, a ‘blockchain’ de petros, tecnologia que permite registrar operações com estas criptomoedas, “foi paralisada, impossibilitando transações”, informou no fim de semana um comunicado divulgado pela plataforma CryptoLand.

A ‘blockchain’ foi reativada brevemente no sábado para depois voltar a ser suspensa até a segunda-feira.

Um provável erro do sistema nas cotações, mas permitiu adquirir petros a preços muito abaixo do mercado, antecipou a situação.

“Esperemos que pouco a pouco sejam restituídos todos os serviços e aplicativos derivados”, publicou o CryptoLand no Twitter.

Investidores denunciam que centenas de contas de usuários do petro foram bloqueadas na plataforma digital de planos sociais do governo, que não deu explicações sobre o ocorrido.

Leia também:

Rolar para cima