Pelo 20º dia consecutivo, Cartum foi abalada nesta quinta-feira (4) por explosões e tiros, que provocaram o fracasso dos esforços mais recentes para prolongar o cessar-fogo no Sudão, que terminou à meia-noite de quarta-feira.
O exército oficial afirmou que estava disposto a respeitar uma nova trégua de sete dias negociada pelos mediadores no Sudão do Sul, mas as Forças de Apoio Rápido (FAR), grupo rival e paramilitar, não responderam ao anúncio.
Moradores de Cartum relataram explosões intensas e tiroteios durante a madrugada nas ruas da capital do país.
Os combates começaram em 15 de abril entre o exército comandado pelo general Abdel Fatah al Burhan, líder de fato do país, e as forças paramilitares de seu ex-aliado e agora rival, Mohamed Hamdan Daglo.
Ao menos 550 pessoas morreram e 4.926 ficaram feridas, de acordo com o balanço mais recente do ministério da Saúde, que provavelmente inclui números conservadores.
O conflito “pegou a ONU de surpresa”, afirmou na quarta-feira o secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres. Ele destacou que a organização internacional confia no sucesso das negociações para uma transição rumo a um governo civil.
“Podemos dizer que fracassamos em impedi-lo”, reconheceu Guterres. “Um país como o Sudão, que já sofreu tanto (…) não pode permitir uma luta pelo poder entre duas pessoas”, acrescentou.
Quando os combates explodiram, os dois generais deveriam participar em uma reunião com mediadores internacionais para falar sobre a integração das FAR ao exército oficial, uma condição crucial para a transição democrática.
Cartum, no entanto, acordou com um cenário de combates nas ruas em 15 de abril.
“A cada minuto de guerra, mais pessoas morrem ou saem às ruas, a sociedade se desintegra e o Estado enfraquece e se decompõe um pouco mais”, disse Khalid Omar Youssef, ministro civil do governo deposto em um golpe de 2021 liderado pelos generais.
O secretário de Assuntos Humanitários da ONU, Martin Griffiths, fez uma visita relâmpago ao Sudão na quarta-feira para negociar uma entrada segura da ajuda e dos trabalhadores humanitários, depois que seis caminhões de assistência do Programa Mundial de Alimentos (PMA) foram saqueados quando seguiam para região de Darfur.
Esta região do oeste do Sudão ainda sofre as consequências de uma guerra que começou em 2003, quando o então ditador Omar al Bashir enviou as milícias Janjaweed, formadas por tribos árabes, para atacar as minorias étnicas rebeldes.
A ONG Conselho Norueguês de Refugiados afirmou que a violência na capital de Darfur Ocidental, El Geneina, deixou pelo menos 191 mortos.
“Dezenas de assentamentos foram incendiados ou destruídos e milhares de pessoas foram deslocadas”, afirmou a ONG.
Tanto Griffiths quanto o enviado especial da ONU para o Sudão, Volker Perthes, conversaram com Burhan e com Daglo por telefone sobre a necessidade de envio de ajuda à população, tuitou o primeiro.
O Alto Comissário das ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk, descreveu a situação como “desoladora” e “catastrófica”.
Além disso, ele acusou o exército de bombardear as proximidades de um hospital e as FAR de usar prédios civis como bases.
Os esforços de mediação são cada vez mais intensos, mas o exército anunciou na quarta-feira que prioriza as iniciativas do bloco regional do leste da África porque deseja “soluções africanas para os problemas do continente”.
Também afirmou que examina uma iniciativa EUA-Arábia Saudita para interromper os combates.
A Liga Árabe se reunirá em caráter de emergência no domingo para abordar a situação no país, informou uma fonte diplomática à AFP.
Quase 450.000 civis abandonaram suas casas desde o início do conflito, informou a Organização Internacional para as Migrações (OIM), incluindo 115.000 que fugiram para outros países.
Desde a queda de Bashir em um golpe em 2019, durante uma revolta popular, os mediadores internacionais tentam levar civis e militares para a mesa de negociações.
Analistas, no entanto, consideram que o processo deu um protagonismo excessivo a Burhan e Daglo, que em outubro de 2021 se aliaram em um golpe que provocou o colapso da transição para um governo civil.
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