O relatório anual do Estado Mental do Mundo, divulgado pela organização de pesquisa sem fins lucrativos Sapien Labs, mostrou que os jovens foram os mais afetados pela covid-19, em relação a saúde mental. No Brasil, pessoas entre 18 a 24 anos relatam 39% mais queixas do que a faixa etária de 55 a 64 anos. Os jovens tem uma probabilidade cinco vezes maior de relatar queixas de saúde mental em comparação com a geração de seus avós, aponta a pesquisa.
A necessidade de manter o distanciamento físico e a redução de atividades presenciais afetaram negativamente a saúde mental dos jovens, que muitas vezes dependem do contato social para se sentirem conectados e pertencentes a um grupo.
“Não há uma única região, grupo linguístico ou país onde o declínio do bem-estar mental em gerações sucessivamente mais jovens não é aparente. Isso se traduz em um aumento dramático na porcentagem de cada geração mais jovem que está mentalmente angustiada ou lutando em um nível qualificável como de natureza clínica ou requerendo ajuda profissional”, aponta o estudo internacional.
Na clínica da psicóloga Mariana Azevedo, especialista em saúde mental e dependência química, houve um aumento expressivo no atendimento a crianças e adolescentes, por isso foi necessário fazer uma capacitação para atender esse público.
“A pandemia aumentou o número de atendimentos de jovens com transtornos mentais, incluindo depressão e ansiedade. Além disso, a falta de contato social, o isolamento e a incerteza do futuro estão entre os fatores que mais contribuem para o agravamento desse quadro”, aponta Mariana Azevedo.
A psicóloga identificou um fenômeno curioso entre os jovens: a necessidade de simbolizar angústias, existenciais e frustrações no corpo por meio de tatuagens.
“A gente percebe esse aumento da tentativa de alivio do desconforto, da angústia, do mal-estar, pelo corpo, por meio das tatuagens”, exemplifica.
Os tempos de isolamento mudaram a maneira como esses jovens interagem socialmente, especialmente após a privação do ambiente escolar por conta do isolamento social.
“Uma das coisas que marca a adolescência é essa separação do núcleo familiar para uma constituição do sujeito. E nesse contexto, o convívio entre jovens que acontecia na escola deixou de existir por conta das restrições e do isolamento social”, explica.
Segundo a psicóloga Mariana Azevedo, há um aumento dramático na porcentagem de cada geração mais jovem que está mentalmente angustiada e busca refúgio no álcool e nas drogas.
“Com esse novo cenário, alguns pacientes passaram a ter acesso a medicações psiquiátricas e a fazer abuso dessas substâncias. Por exemplo, houve um aumento expressivo do uso de Ritalina”, afirma a psicóloga.
O excesso de liberdade e de acesso à informação criou um contraponto entre famílias liberais e outras mais fechadas e dogmáticas.
“O que eu observo que aconteceu na pandemia é que a convivência desses núcleos familiares muito dogmáticos foi assim enlouquecedor, literalmente”, afirma Mariana Azevedo.
Quem já lidava com transtornos mentais antes da pandemia teve sua condição agravada pela falta de acesso a tratamentos adequados de saúde mental.
Apesar do quadro preocupante, a psicóloga ressalta um aspecto positivo dessa pandemia, que foi a diminuição do preconceito contra a terapia e de outros processos de autoconhecimento.
“Muitas pessoas passaram a buscar a terapia para ter qualidade de vida. E agora podem falar sobre o que sentem, das suas vivências, sem que isso precise estar sendo ‘confessado’. Acabam se amparando nisso para se permitir falar de algo que causou um mal-estar, por exemplo”, completa.
(Fonte: Agência Brasil)
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