TSE acusa PL de fabricar relatório ‘mentiroso’ para ‘tumultuar’ eleição

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que integrantes do Partido Liberal (PL) sejam investigados por produzirem um relatório com informações "falsas e mentirosas" sobre a segurança das urnas eletrônicas. O partido do presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, divulgou nesta quarta-feira, 28, documento em que, mesmo sem provas, afirma que o resultado da eleição pode ser fraudado por um grupo de servidores da Corte eleitoral. A reação dos ministros veio três horas e 20 minutos depois da divulgação do texto.

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João Caminoto

O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, determinou que o documento seja remetido ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ser incluído no inquérito das fake news, do qual é relator. O ministro cita a possível responsabilização criminal dos idealizadores. O texto divulgado pelo PL conta com o carimbo do partido, mas não possui a assinatura de nenhum de seus quadros.

“As conclusões do documento intitulado ‘resultados da auditoria de conformidade do PL no TSE’ são falsas e mentirosas, sem nenhum amparo na realidade, reunindo informações fraudulentas e atentatórias ao Estado Democrático de Direito e ao Poder Judiciário, em especial à Justiça Eleitoral, em clara tentativa de embaraçar e tumultuar o curso natural do processo eleitoral”, diz nota do TSE.

Moraes ainda determinou o envio do material à Corregedoria-Geral da Justiça Eleitoral. Ele pede que seja apurado eventual desvio de finalidade na utilização dos recurso do Fundo Partidário pela legenda que abriga o clã Bolsonaro.

Em nota, o TSE afirma que diversos elementos fraudulentos do documento são objetos de investigação no inquérito das fake news e menciona que a Corte Eleitoral já adotou “rigorosas providências” que culminaram, até mesmo, na cassação de diploma parlamentar.

Pouco antes de o partido divulgar a nota, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, esteve na sede do TSE em visita guiada à seção em que são totalizados os resultados da eleição, local que ficou conhecido como “sala secreta” após declarações de Bolsonaro contra as urnas e a Justiça Eleitoral. Após a visita, Costa Neto disse que o ambiente “não é mais secreto” e que, agora, está aberto. No dia anterior, ele ainda teve uma reunião a portas fechadas com Moraes para discutir a reta final das eleições. Na ocasião, teria afirmado ao ministro que discorda do discurso contra as urnas.

A declaração de Costa Neto sobre a sala secreta provocou forte reação de Bolsonaro. O Estadão apurou que o presidente teve uma conversa pouco amigável com Costa Neto e enquadrou o partido. A pressão de Bolsonaro resultou na nota em que as urnas são questionadas. O documento do PL havia sido produzido no dia 19, mas apenas ontem a assessoria do próprio partido divulgou o seu conteúdo.

Nessa reta final das eleições, Bolsonaro voltou a levantar suspeitas sobre o processo de votação e a atacar diretamente o presidente do TSE. Bolsonaro havia abandonado esse discurso para tentar atrair eleitores de fora da sua bolha que rejeitam a radicalização. Desde o início da campanha, ele aparece em segundo lugar nas pesquisas e, mais recentemente, correndo o risco de perder já no primeiro turno para o petista Luiz Inácio Lula da Silva.

Segundo um integrante do PL, o presidente está “descontrolado” desde que soube que Moraes autorizou a quebra de sigilo bancário do seu ajudante de ordem, Mauro Cesar Barbosa Cid, que está sob suspeita de pagar contas pessoais de Bolsonaro e da primeira-dama Michelle. A Polícia Federal investiga a origem do dinheiro; Bolsonaro diz ser da sua conta pessoal. Aliados descrevem o presidente como “possesso” e dizem que “vai ter troco”.

Relatório

No documento intitulado “Resultados da Auditoria de Conformidade do PL no TSE”, o partido insinua que o resultado das eleições pode ser fraudado dentro da Corte. “Somente um grupo restrito de servidores e colaboradores do TSE controla todo o código fonte dos programas da urna eletrônica e dos sistemas eleitorais. Sem qualquer controle externo, isto cria, nas mãos de alguns técnicos, um poder absoluto de manipular resultados da eleição, sem deixar qualquer rastro”, diz a legenda.

A acusação da sigla não possui lastro na realidade, tampouco embasamento científico, pois dezenas de partidos, incluindo o próprio PL, inspecionaram os códigos-fonte das urnas. Algumas siglas, como o PTB, chegaram a atestar a confiabilidade dos sistemas ao assinar digitalmente os programas inseridos nos dispositivos de votação.

O TSE sustenta que não existe interferência humana na contagem dos votos. Os servidores que trabalham na sala de totalização apenas monitoram o funcionamento do sistema.

No início de setembro, entidades fiscalizadoras das eleições, como a Polícia Federal, as Forças Armadas e a Controladoria-Geral da União (CGU) também assinaram digitalmente os sistemas inseridos nas urnas, num atestado de que os dispositivos contém codificação segura e inviolável.

A pedido de Bolsonaro, o partido contratou o Instituto Voto Legal para auditar a eleição. De acordo com o PL, a ideia é realizar a fiscalização de todas as fases da votação, apuração e totalização dos resultados da eleição. “A metodologia escolhida busca, sempre, a colaboração construtiva com a alta direção do TSE, porque quem audita constrói valor para a organização auditada”, diz a sigla.

O partido de Bolsonaro disse ainda que divulgou o texto porque não conseguiu uma nova reunião com o TSE para tratar sobre o assunto. Apesar disso, Costa Neto esteve duas vezes nesta semana com Alexandre de Moraes. “Não obstante a urgência e a gravidade das evidências encontradas, o TSE não respondeu, até o momento, aos inúmeros pedidos para agendar uma reunião para tratar do tema. Este fato tornou necessária a divulgação dos resultados da avaliação da equipe técnica do PL, sobre os documentos públicos encontrados”.

Após a reação de Moraes, a assessoria do PL divulgou nota na qual diz que Costa Neto “vê o documento como uma forma de contribuir para o aprimoramento do processo eleitoral” e que o chefe do PL “reitera sua confiança no sistema eleitoral brasileiro”.

(com Estadão Conteúdo)

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João Caminoto

Jornalista com mais de 30 anos de experiência, ocupei diversos cargos - desde repórter, passando por correspondente internacional até diretor de redação - em diversas casas, como o Estadão, Broadcast, Época, BBC, Veja e Folha. Me sinto privilegiado em ter abraçado essa profissão. Apaixonado pela minha família e pelo Corinthians.

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