Tecnologia

As big techs devem ser capazes de ler suas mensagens?

"Criptografia de ponta a ponta", "backdoors" e "varredura do lado do cliente" - tudo parece muito complicado. Mas, na verdade, tudo se resume a uma pergunta muito simples: as empresas de tecnologia, conhecidas como 'big techs', devem ser capazes de ler as mensagens das pessoas?

Publicado por
Isabella Caminoto

Esse Ă© o cerne de uma briga que vem se formando hĂĄ anos entre o Vale do SilĂ­cio e os governos de pelo menos uma dĂșzia de paĂ­ses ao redor do mundo.

WhatsApp, iMessage, Android Messages e Signal usam o sistema super seguro chamado criptografia de ponta a ponta.

A tecnologia significa que apenas o remetente, de um lado, e o destinatĂĄrio, do outro, podem ler mensagens, ver mĂ­dia ou ouvir chamadas telefĂŽnicas. Mesmo os criadores de aplicativos nĂŁo podem acessar o conteĂșdo.

Grande transição

Nos Ășltimos 10 anos, os aplicativos criptografados de ponta a ponta se tornaram cada vez mais populares, com bilhĂ”es de pessoas usando-os todos os dias.

A maioria dos governos e agĂȘncias de segurança aceitou com relutĂąncia a ascensĂŁo da tecnologia – atĂ© quatro anos atrĂĄs, quando Mark Zuckerberg, da Meta, anunciou que o aplicativo Messenger e, em seguida, o Instagram adotaria a criptografia de ponta a ponta como padrĂŁo.

“Vamos permitir que mais de dois bilhĂ”es de pessoas em todo o mundo tenham suas conversas mais pessoais em particular”, disse ele.

Ao que tudo indica, a grande transição acontecerĂĄ “AtĂ© o final de 2023”.

CrĂ­ticas Ă  tecnologia

Enquanto isso, os apelos para interromper a transição ou construir salvaguardas estão ficando mais altos.

Autoridades do Reino Unido, AustrĂĄlia, CanadĂĄ, Nova ZelĂąndia, Estados Unidos, Índia, Turquia, JapĂŁo e Brasil – alĂ©m de agĂȘncias policiais como a Interpol – criticaram a tecnologia. Mas nenhum governo no mundo democrĂĄtico se arriscou a aprovar uma lei que interferiria nesses aplicativos populares – atĂ© agora.

Fazer com que as empresas de tecnologia construam algum tipo de backdoor técnico para permitir que as mensagens sejam verificadas em busca de material ilegal é um dos princípios centrais da Lei de Segurança Online do Reino Unido, que provavelmente serå aprovada em um futuro próximo.

Os policiais, se nĂŁo puderem mais pedir Ă  Meta o conteĂșdo das mensagens das pessoas, perderĂŁo uma fonte importante de evidĂȘncias que usam regularmente para condenar criminosos ou terroristas, diz o governo britĂąnico.

E hå uma preocupação particular com o fato de as crianças serem aliciadas online em segredo.

A criptografia de ponta a ponta “serĂĄ um grande benefĂ­cio para qualquer um que queira machucar uma criança”, escreveu a secretĂĄria do Interior do Reino Unido, Suella Braverman, a Zuckerberg na Ășltima segunda-feira (3).

Em resposta, um porta-voz da Meta disse que a empresa “desenvolveu medidas de segurança que previnem, detectam e nos permitem agir contra esse abuso hediondo” – restriçÔes de idade para entrar em contato com estranhos, por exemplo.

Reconstruindo a confiança

O WhatsApp e o Signal jå disseram que preferem remover seus serviços do Reino Unido do que enfraquecer a segurança da criptografia de ponta a ponta.

E para piorar as coisas para os críticos da tecnologia, Elon Musk anunciou, em maio, que também estava criando criptografia de ponta a ponta nas mensagens do Twitter.

Depois de anos de escùndalos de dados, as big techs veem a tecnologia como a chave para reconstruir a confiança em seus serviços.

E, em uma feliz coincidĂȘncia, a criptografia de ponta a ponta facilita muito o complicado trabalho de moderação dessas empresas em apuros – se eles nĂŁo podem ver o que os usuĂĄrios estĂŁo compartilhando, tambĂ©m nĂŁo podem fiscalizĂĄ-lo.

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Isabella Caminoto

Advogada e mestranda em Direito Internacional, tenho a democracia e a liberdade como bandeiras irrenunciĂĄveis. Sou apaixonada pelos animais e acredito que o bem-estar do nosso planeta deveria ser o destaque diĂĄrio da pauta da nossa sociedade.

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