As gírias cariocas e o sotaque do ‘x’ carregado fazem com que os habitantes da Cidade Maravilhosa sejam reconhecidos em qualquer parte do Brasil. Mas, além do português brasileiro, o Rio de Janeiro têm uma segunda língua. Conhecido como Gualín do TTK, o dialeto é próprio do bairro do Catete, na Zona Sul do Rio.
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De acordo com a bacharel em Letras e pesquisadora Lívia Marins, a Gualín do TTK consiste em trocar a ordem silábica das palavras. Por exemplo, TTK significa Catete: quando dito ao contrário, Catete se torna “Teteca”.
“As palavras, na sua maioria dissílabas, trissílabas e polissílabas, têm suas sílabas invertidas de uma maneira quase aleatória, mas de uma forma que todas as sílabas ocupem espaços diferentes da sua posição originária”, explica.
@curtonews Entre as centenas de línguas faladas no Brasil, você sabia que existe um idioma criado em um bairro do Rio de Janeiro? Estamos falando da Gualín do TTK. Quem explica é Lívia Marins, bacharel em Letras e pesquisadora sobre o assunto.
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Como surgiu?
Quando o Rio de Janeiro ainda era a capital do Brasil, o Palácio do Catete era a moradia oficial dos presidentes da República. Após a mudança da capital para Brasília, lugar se tornou palco de grandes representações da política brasileira. Por isso, o local ficou marcado por diversos protestos e manifestações contra a ditadura militar brasileira no início da década de 60.
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Lívia conta que a Gualín do TTK surgiu para ajudar a população do bairro se comunicar e fugir da censura do poder militar e repressão da época. “O “KLG” (triângulo composto por Catete-Glória-Lapa) foi um reduto de diversos grupos sociais contrários ao governo militar”, afirma.
Com o afrouxamento da repressão e a ascensão do rap e do skate nos anos 80, passou a ser um instrumento de representatividade e símbolo de pertencimento. O dialeto se transformou após o período da ditadura militar e ganhou um novo significado.
A Gualín do TTK ajudou a promover uma forte cultura urbana na cidade do Rio de Janeiro, de acordo com Lívia. A língua, além de ser um recurso de comunicação, também representa uma formação identitária e pertencimento de grupos subversivos. O dialeto deixou de ser um mecanismo censurado para se tornar um símbolo cultural.
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“Cada palavra que você cria na Gualín do TKK é infinitamente ideológica devido ao seu contexto de criação. É uma escolha de reafirmação do território se comunicar nessa língua”, explica a especialista.
@curtonews Criado no bairro do Catete, zona sul do Rio de Janeiro, o Gualín do TTK surgiu para ajudar a população do bairro a se comunicar e fugir da censura do poder militar e repressão da ditadura. #filiperet #gualindottk ♬ som original – Curto News
Gualín do TTK na música e nas redes
Um dos representantes da linguagem e nascido no Catete, o rapper Filipe Ret criou uma música totalmente no dialeto. “Tributo ao TTK” conta com participações dos músicos BK, Sain, Mãolee, DJ Erik Skratch e 2Nunaip.
Em 2021, a Amazon Music produziu, com direção de Felipe Ret, um minidocumentário sobre a origem e importância da Gualín do TTK na cultura carioca.
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Além da influência na cultura urbana carioca, Lívia ressalta a importância da existência da Gualín do TTK enquanto riqueza cultural brasileira. “Essa língua surgiu em contexto onde as pessoas precisavam se esconder da sociedade. Hoje, no entanto, a Gualín volta como um instrumento de reafirmação”.
Agora, a língua vem recebendo mais visibilidade nas redes sociais. Na esteira de figuras do rap, a Gualín do TTK passou a ser conhecida para além dos limites do Catete-Glória-Lapa. Inclusive, a própria Lívia publicou um vídeo explicando sobre o dialeto em suas redes.